CAPÍTULO 1
- Pois é, seu Carlos. Agora é contigo.
- Quanto tempo o senhor me dá pra resolver a situação?
- Olha... No máximo três dias. Você me conhece e sabe que comigo o serviço tem que render.
- Tudo bem, até sábado.
***
Nossa, aqui em Valinhos não costuma chover muito, mas hoje... Sinceramente, faz tempo que eu não via chover assim. Mas tudo é da vontade de Deus, então não adianta reclamar.
Entrei em casa, gritando:
- Mãe! Mãe!
Ué, a minha mãe é uma das mulheres mais prestativas que eu conheço. Será que não tem ninguém em casa? Pelo jeito...
Olhei pela janela, e foi comprovado o que pensei. O carro não estava no lugar de sempre. No lugar dele tinha uma ovelha comendo capim. Sério! Você deve estar pensando: “Ovelha, capim?” Fácil de imaginar o cenário? É isso mesmo. Eu moro em uma chácara. Sítio, fazenda, o nome que você chama aí na sua região.
Sim, um lugar cheio de mato, galinhas, “porcos”, acredite, porco! Fazer o que?
É a vida... Sabe, eu não reclamo, acredite, se você conhecer o lugar de perto, canto por canto, como eu conheço, irá gostar.
Nem tanto se não estiver acostumado com mato, MUITO mato, e... barro. Um dos pontos negativos do lugar. Principalmente quando chove, como hoje, sabe? Tudo vira lama e é preciso se aquietar dentro de casa, senão tem que ir pra escola com os tênis mais imundos que o normal.
Opa, falando em tênis, tenho que ir lá no tanque limpar o meu, senão minha mãe chega e aí... xingãozinho básico. Mas não pense que ela é irritadinha, não. É que às vezes eu passo dos limites. Como todas as garotas da minha idade devem passar, me entende? Se você tem 15, 16, 17... por aí, ou até já passou por essa fase, sabe do que estou falando.
Ah não, essa fisgada na barriga. Eu sei muito bem o que é isso. Chama-se fome. Já pra cozinha. Acho que faz tempo que o pessoal saiu, porque nem tem comida pronta.
Pessoal, quero dizer, meu pai, minha mãe e meu irmãozinho. Carlos, Suzana e Júnior. Essa é minha família. Pequena, graças a Deus. Aliás, ultimamente eu tenho notado uma coisa. Que aqui em casa a maioria das coisas são pequenas. Começando pela casa. Meu quarto é pequeno (meu é modo de dizer, porque eu divido ele com meu irmão de 4 anos), o banheiro, sem comentários. É mínimo. Um apeeeerto! A geladeira? Devo estar uns 20 centímetros mais alta que ela. Mas, apesar da simplicidade, eu sou bem feliz aqui. Gosto do lugar.
Pronto. Almoço pronto. Arroz, feijão (só esquentei), carne de galinha (amo asa!) e polenta. Meu prato preferido. Aproveitei que a mãe não está em casa e não fiz salada. É que... bem, não sou muito fã, não. Como porque é bom pra saúde.
Estava pensando aqui, enquanto almoço, bem que o pai poderia comprar um celular. Pra gente se comunicar quando ele não está por perto. Mas, ele não é muito chegado nessas novas tecnologias, então... tudo bem.
Eu não disse o meu nome, né? Carla, prazer. Graças ao bom Deus que ganhei esse nome. Tá certo que não é AQUELE nome, do tipo cheio de frescurinha, como Rafaelly, mas... se comparado ao nome que eu ia receber... Tenho até vergonha de contar. Mas vai aí. Iracildes. Não ria, é isso mesmo. Feio, né? Também acho. Fazer o que se minha mãe amava a avó dela. Mas não precisava descontar em mim, né? Não que eu não goste do nome dela. Nada a ver. Mas... enfim, não é nem um pouco agradável. Concorda? Obrigada. Então, não sei se você reparou, meu pai preferiu um nome parecido com o dele. Carlos, Carla. Assim sim, dá pra levar.
Opa, ouvi um barulho. É, eles chegaram. Deixa eu ver... Nossa, já fazem duas horas que eu estou aqui sentada, pensando. Não tô comendo mais, não se preocupe. É que tenho mania de ficar assim, voaaaando.
- Mana!
É, ele tem esse costume de gritar, ou melhor, berrar. E de se jogar no meu colo, sempre quando eu não estou esperando. Tipo agora...
- Oi, mãe.
- Ah, você está aí, filha? Estava com medo de você não ter levado a chave e estar toda molhada.
- Não, mãe. Eu levei a chave, está tudo bem. E vocês, aonde foram?
- Fomos lá no Senhor Adilson...
- E já almoçaram?
- Não. Você fez almoço?
- Sim.
- Então esquenta a comida enquanto eu vou ajudar o teu irmão a trocar de roupa.
- Tudo bem.
Bem que poderiam já ter almoçado. Ola a hora que é. Mas vai entender a cabeça desses adultos. Olhei pra fora de novo. Nada do carro. Mas o meu pai estava passeador, hein? Só pra lá e pra cá. Haja gasolina! E eu indo pra escola de busão...
***
O resto do dia passei no quarto estudando. Fazer o que se as professoras resolveram marcar duas provas no mesmo dia, na semana antes das férias. E sabe como é Matemática e Biologia do terceiro ano, né? Puxadérrimas. Então eu estudo mesmo. Mas não que eu sou CDF. Bem capaz. Só me esforço pra acabar de uma vez, sem recuperação.
Vivo dizendo pra Celine se esforçar mais também, mas não adianta. Ah sim. Celine é a minha melhor amiga. Que não é muito fã dos livros e cadernos. Não é que ela seja desleixada, é que ama desenhar. Aí, sabe como é, se concentra em qualquer gravura e esquece da vida. Hoje mesmo ela me ligou pra pedir o que vai cair nas provas. É, ela não sabia mesmo. E amiga é pra essas coisas, então... até precisei dar algumas explicações via telefone. Ê vida!
CAPÍTULO 2
Acredita que eu acabei dormindo em cima dos livros? Se não fosse a minha mãe, teria acordado toda doída. Eita eu.
Deixa eu desligar esse despertador. Que barulhinho mais enjoado! Piripipi, piripipi, piiiiiiiiiiiiiii. O pi mais agudo que eu já ouvi. Não desejo pra ninguém acordar com esse fundo musical.
Entrei no ônibus. Meu pai não estava em casa quando eu saí. Sei lá o que ele anda aprontando. Anda todo misterioso... Mas, to aqui. Carregada de livros na mão. É o que dá não ter dindim pra comprar uma mochila nova. É que a minha arrebentou a alça fazem uns 3 meses. E ainda não juntei grana suficiente pra comprar uma nova. Pobre, né? Ahãm.
***
Deu tudo certo, acho que fui bem nas provas. Com certeza não gabaritei, mas também atingi mais que a média. O que já é suficiente. Nunca fui de tirar as notas mais altas da turma, mesmo. Às vezes eu impressiono. Mas isso lááá de vez em quando. Dá pra contar nos dedos.
- Pois é, seu Carlos. Agora é contigo.
- Quanto tempo o senhor me dá pra resolver a situação?
- Olha... No máximo três dias. Você me conhece e sabe que comigo o serviço tem que render.
- Tudo bem, até sábado.
***
Nossa, aqui em Valinhos não costuma chover muito, mas hoje... Sinceramente, faz tempo que eu não via chover assim. Mas tudo é da vontade de Deus, então não adianta reclamar.
Entrei em casa, gritando:
- Mãe! Mãe!
Ué, a minha mãe é uma das mulheres mais prestativas que eu conheço. Será que não tem ninguém em casa? Pelo jeito...
Olhei pela janela, e foi comprovado o que pensei. O carro não estava no lugar de sempre. No lugar dele tinha uma ovelha comendo capim. Sério! Você deve estar pensando: “Ovelha, capim?” Fácil de imaginar o cenário? É isso mesmo. Eu moro em uma chácara. Sítio, fazenda, o nome que você chama aí na sua região.
Sim, um lugar cheio de mato, galinhas, “porcos”, acredite, porco! Fazer o que?
É a vida... Sabe, eu não reclamo, acredite, se você conhecer o lugar de perto, canto por canto, como eu conheço, irá gostar.
Nem tanto se não estiver acostumado com mato, MUITO mato, e... barro. Um dos pontos negativos do lugar. Principalmente quando chove, como hoje, sabe? Tudo vira lama e é preciso se aquietar dentro de casa, senão tem que ir pra escola com os tênis mais imundos que o normal.
Opa, falando em tênis, tenho que ir lá no tanque limpar o meu, senão minha mãe chega e aí... xingãozinho básico. Mas não pense que ela é irritadinha, não. É que às vezes eu passo dos limites. Como todas as garotas da minha idade devem passar, me entende? Se você tem 15, 16, 17... por aí, ou até já passou por essa fase, sabe do que estou falando.
Ah não, essa fisgada na barriga. Eu sei muito bem o que é isso. Chama-se fome. Já pra cozinha. Acho que faz tempo que o pessoal saiu, porque nem tem comida pronta.
Pessoal, quero dizer, meu pai, minha mãe e meu irmãozinho. Carlos, Suzana e Júnior. Essa é minha família. Pequena, graças a Deus. Aliás, ultimamente eu tenho notado uma coisa. Que aqui em casa a maioria das coisas são pequenas. Começando pela casa. Meu quarto é pequeno (meu é modo de dizer, porque eu divido ele com meu irmão de 4 anos), o banheiro, sem comentários. É mínimo. Um apeeeerto! A geladeira? Devo estar uns 20 centímetros mais alta que ela. Mas, apesar da simplicidade, eu sou bem feliz aqui. Gosto do lugar.
Pronto. Almoço pronto. Arroz, feijão (só esquentei), carne de galinha (amo asa!) e polenta. Meu prato preferido. Aproveitei que a mãe não está em casa e não fiz salada. É que... bem, não sou muito fã, não. Como porque é bom pra saúde.
Estava pensando aqui, enquanto almoço, bem que o pai poderia comprar um celular. Pra gente se comunicar quando ele não está por perto. Mas, ele não é muito chegado nessas novas tecnologias, então... tudo bem.
Eu não disse o meu nome, né? Carla, prazer. Graças ao bom Deus que ganhei esse nome. Tá certo que não é AQUELE nome, do tipo cheio de frescurinha, como Rafaelly, mas... se comparado ao nome que eu ia receber... Tenho até vergonha de contar. Mas vai aí. Iracildes. Não ria, é isso mesmo. Feio, né? Também acho. Fazer o que se minha mãe amava a avó dela. Mas não precisava descontar em mim, né? Não que eu não goste do nome dela. Nada a ver. Mas... enfim, não é nem um pouco agradável. Concorda? Obrigada. Então, não sei se você reparou, meu pai preferiu um nome parecido com o dele. Carlos, Carla. Assim sim, dá pra levar.
Opa, ouvi um barulho. É, eles chegaram. Deixa eu ver... Nossa, já fazem duas horas que eu estou aqui sentada, pensando. Não tô comendo mais, não se preocupe. É que tenho mania de ficar assim, voaaaando.
- Mana!
É, ele tem esse costume de gritar, ou melhor, berrar. E de se jogar no meu colo, sempre quando eu não estou esperando. Tipo agora...
- Oi, mãe.
- Ah, você está aí, filha? Estava com medo de você não ter levado a chave e estar toda molhada.
- Não, mãe. Eu levei a chave, está tudo bem. E vocês, aonde foram?
- Fomos lá no Senhor Adilson...
- E já almoçaram?
- Não. Você fez almoço?
- Sim.
- Então esquenta a comida enquanto eu vou ajudar o teu irmão a trocar de roupa.
- Tudo bem.
Bem que poderiam já ter almoçado. Ola a hora que é. Mas vai entender a cabeça desses adultos. Olhei pra fora de novo. Nada do carro. Mas o meu pai estava passeador, hein? Só pra lá e pra cá. Haja gasolina! E eu indo pra escola de busão...
***
O resto do dia passei no quarto estudando. Fazer o que se as professoras resolveram marcar duas provas no mesmo dia, na semana antes das férias. E sabe como é Matemática e Biologia do terceiro ano, né? Puxadérrimas. Então eu estudo mesmo. Mas não que eu sou CDF. Bem capaz. Só me esforço pra acabar de uma vez, sem recuperação.
Vivo dizendo pra Celine se esforçar mais também, mas não adianta. Ah sim. Celine é a minha melhor amiga. Que não é muito fã dos livros e cadernos. Não é que ela seja desleixada, é que ama desenhar. Aí, sabe como é, se concentra em qualquer gravura e esquece da vida. Hoje mesmo ela me ligou pra pedir o que vai cair nas provas. É, ela não sabia mesmo. E amiga é pra essas coisas, então... até precisei dar algumas explicações via telefone. Ê vida!
CAPÍTULO 2
Acredita que eu acabei dormindo em cima dos livros? Se não fosse a minha mãe, teria acordado toda doída. Eita eu.
Deixa eu desligar esse despertador. Que barulhinho mais enjoado! Piripipi, piripipi, piiiiiiiiiiiiiii. O pi mais agudo que eu já ouvi. Não desejo pra ninguém acordar com esse fundo musical.
Entrei no ônibus. Meu pai não estava em casa quando eu saí. Sei lá o que ele anda aprontando. Anda todo misterioso... Mas, to aqui. Carregada de livros na mão. É o que dá não ter dindim pra comprar uma mochila nova. É que a minha arrebentou a alça fazem uns 3 meses. E ainda não juntei grana suficiente pra comprar uma nova. Pobre, né? Ahãm.
***
Deu tudo certo, acho que fui bem nas provas. Com certeza não gabaritei, mas também atingi mais que a média. O que já é suficiente. Nunca fui de tirar as notas mais altas da turma, mesmo. Às vezes eu impressiono. Mas isso lááá de vez em quando. Dá pra contar nos dedos.
Olá Bruna,comecei a acompanhar seu blog.Achei interessante a forma de você escrever.
ResponderExcluirBeijos!!!
Oi, estou seguindo o seu blog e também achei muito interessante a maneira de você escrever, muito original mesmo. Nestes blogs há vários talentos escondidos. Gostaria muito que seguisse o meu e mais ainda de ver seus comentários nos capítulos: http://viniciuscannone.blogspot.com/2009/10/vidas-separadas.html
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